terça-feira, 4 de abril de 2017

Dissertação: Maurício Rosa e percurso no papel artesanal.

O TRAÇO COMO PERCURSO SOBRE O PAPEL.

          Primeiro os olhos, janelas para o mundo, se apaixonaram pelas imagens. 
          Pinturas minimalistas e suntuosas galerias pintadas em pedras nas cavernas ainda hoje nos causam espanto e admiração. Estes presentes de nossa pré-história são os primeiros registros que exemplificam a necessidade do homem de se expressar de forma diferente da tradição oral e corporal. Este é o momento da transição da oralidade para a escrita, a criação de signos que serão adorados e respeitados, assim como os materiais que lhes servirão de suporte, por seu conteúdo e conhecimento. É o inicio da imagem, da história e a conexão com o espaço e tempo.  Sobre a arqueologia nos debruçamos em busca de compreender o caráter sagrado, comum em tantas culturas ancestrais. 
          
           Ainda lembro-me de menino a apreciar Toulosse Lautrec e me gabar deste gosto. Ele foi o artista que primeiro me despertou o interesse com suas cores, desenho e temática. Atualmente, após ter visto pessoalmente alguns desenhos, poderia também dizer dos papeis utilizados. Funcionou comigo como o grande publicitário da arte e a partir dele me debrucei sobre o estudo da trajetória de inúmeros artistas predecessores e seus contemporâneos. Os impressionistas e uns alguns depois. Reconheço o quanto às apreciações de estampas e o estudo da historia me alimentaram no desenvolvimento de novas estéticas. Mas minha linguagem não era somente o desenho, a escrita ou poética visual. Por enxergar belezas pelo mundo me apodero da fotografia como ferramenta de linguagem e de integração junto ao movimento cultural em Brasília. Também a fotografia não me bastava, após a formação técnica ansiava por novas leituras e assim frequentei oficinas de novas linguagens fotográficas com Rosangela Renno e Claudio Feijó. Esta busca de possibilidades traz a libertação da imagem. Prossigo procurando novos suportes e é por aí que o papel artesanal entra em minha vida. 
          
           Na década de 90, através da primeira turma de fibra do projeto saber-fazer, no projeto de revitalização e implantação do Museu Vivo da Memória Candanga – HJKO – Brasília (DF), coordenado por Rosane Stukert. Oportunidade de aprender a técnica do papel artesanal e vivenciar novas possibilidades e linguagens em contato direto com alguns dos primeiros multiplicadores e de outros artistas nesta linguagem. Oficinas com Diva Helena Buss, Nícia Mafra, Vera Queiroz,
 Joyce Saturnino, Lincoln Volpini, Hilal Sami Hilal e Shirley Paes Leme.
ARTE é como uma centelha, a luz que desperta a comunicação com o externo, ascende a sua consciência e criatividade. O artista como um enlaçador de sonhos do mundo, atento as conexões, aos caminhos, é parte do todo, como as fibras nas folhas do papel.

          O entrelaçar das microfibras ao escorres a água e surgir a folha de papel artesanal trás em si a mesma magia de revelar uma imagem à luz, seja sob das tochas nas cavernas ou em um laboratório de fotografia.  Depois a folha se torna o acaso, ausência e possibilidade. O tudo e o nada como já foi dissertado por Fayga Ostrower ou o INTERSER de Thich Nhat Hanh.  O contacto com o papel artesanal como novo material de expressão, a proximidade de amigos artistas, a apreciação de diversas exposições favorece a aproximação com linguagens ligadas ao construtivismo, ainda de forma desordenada e sem cronologia histórica.  A concentração, isolamento e imersão fazem parte de minha formação, tanto quanto a pesquisa, o conhecimento, a comunicação, intercâmbio de resultados.  A busca de compreender o processo criativo e se enquadrar dentro dos conceitos e movimentos sociais e plásticos são reinterpretados nas pesquisas em diferentes produções, experimentações para o autoconhecimento. Assim a arte é também esta troca de experiências, vivencias e modelos em busca do espiritual.

          O papel artesanal, por sua natureza e história me conectou diretamente a uma rede de sonhos do mundo, crio a MR Papel - PAPELaria ARTEsanal.
Assim após alguns anos desenvolvendo pesquisas com várias plantas para a produção da linha de papel artesanal Botânico, tenho os resultados de uma pesquisa exclusiva de Papel da de entrecasca de pinhão, fruto da Araucária Angustifólia, o único pinheiro genuinamente brasileiro. De coloração marrom escuro, indicado para ser utilizado como material de expressão, integração e identidade para a Região turística de Visconde de Mauá e passo a utiliza-lo em meus trabalhos de artes plásticas, encadernações e produção de livros de arte através de nossa  editora artesanal “Edições em papel de ontem”.  No caminho do minimalismo e conceitual, por vezes a folha é exposta e se basta enquanto obra completa.

          No principio ainda purista com os papeis artesanais em tons de cru, utilizo técnicas e estéticas inseridas nas artes plásticas no ultimo século.  Colagens geométricas e textura e avançando para além do impressionismo, mais a vontade navegando em vertentes mais modernas e conceituais das artes plásticas com as Assemblages, Frottages e acrílicas com Grattages.  Assim vou acrescentando colorido aos trabalhos, adicionando papeis coloridos, imagens, tintas lápis e outros materiais.  Passo a convidar amigos papeleiros, artistas e fotógrafos a utilizar os papeis Botânicos em suas obras. Surgirão múltiplas linguagens que gerou a exposição coletiva “O papel das vilas” e suas 14 edições subsequentes, sempre com a colaboração dos artistas e parceria com os espaços culturais. Um projeto inclusivo envolvendo mais de 100 participantes. Sua primeira edição foi realizada em 2009 no Centro Cultural Visconde de Mauá, no ano em que completaria 30 anos que Otávio Roth iniciou as pesquisas de produção de papel artesanal no Brasil. Isto nos é recordado por Diva Buss, artista plástica da 1º núcleo de pesquisa da fibra da UFMG, uma de nossas primeiras multiplicadoras da técnica do papel artesanal.  Assim a exposição se torna uma celebração à história do papel artesanal brasileiro. https://galeria-ambiente.blogspot.com.br/2017/03/artistas-do-o-papel-das-vilas-e-sua.html

          O movimento acontece porque era o sonho de todos, era o sonho do mundo.  Tudo isto se soma como uma experiência muito enriquecedora, um grande laboratório de artes plásticas, com liberdade e expressão, como exercícios de produção, expografia e curadoria de exposições de artes plásticas.                                                                                                           O sonho de Diva Buss , com uma nova centelha.  Em 2010 após receber uma obra de sua autoria pelos correios, encaminhou-me um email com seus desejos...
 "... NAO É FÁCIL SER ARTISTA NO BRASIL, VAMOS FAZER UM LEVANTAMENTO DOS ARTISTAS DO PAPEL ESPALHADOS PELO BRASIL E REINICIAR A ARTE POSTAL EM PAPEL ARTESANAL, QUE TAL A IDEIA? NOS ANOS 80 PARTICIPEI DA ARTE POSTAL INTERNACIONAL FOI ÓTIMO... Diva Buss - Wednesday, February 24, 2010, 4:57:52 PM".
Funcionamos como antenas, captadores de desejos e reconectores que os reinserem na rede do mundo.

           Com a morte prematura de meu irmão artista plástico e educador Rodrigo Rosa, fico responsável por seu trabalho.  Este foi contemplado com o Premio Marcantonio Vilaça 7ª edição – FUNARTE – MinC, para complementação do acervo do Museu Nacional de Republica, do Conjunto Cultural da Republica em Brasília (DF). Com a doação do conjunto de esculturas, desenhos e pinturas referentes ao site specific Arquipélago Férreo e um recorte representativo de sua obras completa. Foi efetivada a doação, com posterior exposição, ação educativa, criação do site e outras mídias. Foi necessária uma dedicação exclusiva para localização, identificação e catalogação do acervo, com visita aos dois ateliês do artista, limpeza e embalagem de obras e translado para doação ao MuN. Um período de sensibilização e imersão em sua obra, universo e percurso. Leitura e reflexão sobre os textos críticos e observação de sua extensa biblioteca, constituída em grande parte por livros de artes plásticas com tendências para arquitetura, escultura e instalações.
Feito a cronologia, percebi que era a trajetória a linha que imaginei para apresentar na exposição em sua homenagem. Interligar peças soltas de algumas instalações, com esculturas e grupos de obras em papel.
RODRIGO ROSA: A FORMA E A ARTE DA CIDADE - foi concebida como um tributo, “Um passeio pelo percurso e um encontro com o artista”. Desejo do artista “em nenhum lugar, em todo lugar” e um desafio. Uma imersão na arte das instalações, dos penetráveis e do que ainda esta a frente de seu tempo.  Na entrada vitrine apresentando gravuras e desenhos de seu período acadêmico, seguida da reprodução da escultura site specific “Cubo Branco”, o percurso encontramos preenchido por esculturas geométricas, pinturas murais e sobre papeis, vídeo e memórias.  Realizada em duas salas, realizei a concepção do projeto expografico supervisionado por Wagner Barja e Ana Frade. 
           Esta experiência redimensionou minha maneira de ver a arte, criou novas realidades e compromissos com as artes visuais num caminho sem volta.
 O espaço se torna moldura.                                                                                                                       http://rodrigo-rosa.sitepx.com/rodrigo-rosa-50-anos-a-forma-e-arte-da-cidade-2016.html

           Foi um período misto de realização, aceitação e orgulho pelas realizações de meu irmão e muito trabalho a realizar, tinha fundir nossos caminhos.  Desenvolvo o conceito e crio a GALERIA AMBIENTE – projeto in progress - Para resguardar acervos preciosos na Serra Mantiqueira, sua memória e tradição.  Procurando meios de gerenciar os meus acervos associados ao de meu irmão Rodrigo Rosa, conjuntamente ao do grupo “O papel das vilas”, arquivos de Arte Postal e demais obras de artistas regionais e convidados.  Visa a implantação de infraestrutura em uma área disponível de natureza reconstituída e fácil acesso na região Turística de Visconde de Mauá, um projeto sustentável para preservação, exposições, movimentação, comercialização e intercâmbio de artistas, eventos, oficinas, vivencias, produção cultural e divulgação de artes. A arte dentro e fora do CUBO BRANCO na Serra da Mantiqueira, por deixaram suas marcas artistas reconhecidos como Augusto Rodrigues , Alfredo Guignard, Fayga Ostrower, Rubens Gerchman, Roberto Magalhaes, Clécio Penedo, Jose Carlos Boi Ferreira, Roberto Campadello além de um grande grupo de artistas a procura de uma alternativa de vida.

          Oportunamente sou convidado a participar do projeto de Suyan de Mattos, CARTA/OBRA numa releitura da arte postal internacional. Intensifico os intercâmbios e produção de Arte Postal, como um exercício livre, de formação de identidade e desapego, trabalhando com o papel artesanal em novos formatos pela rede de correspondentes.  A arte postal funciona como um canal de comunicação, reinserção e empoderamento conceitual neste período de transição. Participo de exposições e sou responsável pela produção e organização da 1ª Quinzena de Arte Postal de visconde de Mauá, com o 1º salãoARTEcorreios e exposição do CARTA/OBRA, resultado de meu intercambio com o coletivo de 52 artistas e atividades afins.                                                                        http://galeria-ambiente.sitepx.com/mauricio-rosa-arte-postal-cartaobra-mail-art.html

trajetória é o traço sobre o espaço definido do papel.
A matéria modelada pela história, estimulada se torna  folha,  livro, instalação, uma centelha no mundo.
Maurício Rosa

















2 comentários:

  1. Bacana sua trajetória, Maurício. A gente deve ter se cruzado nessas oficinas do Museu, junto com nossa amiga papeleira Miriam Pires, através da Sec. do Meio Ambiente do DF batalhamos muito pra conseguir recurso e fazer acontecer essas oficinas Papel Novamente Papel. Tempo de conquistas memoráveis esse do Museu da memória Candanga, muita gente boa passou por ali. O cartaz do encontro é de minha autoria. Vou procurar um pra levar pra você.

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    1. Legal Romulo, o que tinha que era uma foto montagem com folhas artesanais, se foi, sera bem vindo. abração.

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